Sobre o Tecnocolonialismo
O tecnocolonialismo não envolve a apropriação de territórios físicos, mas sim o controle geopolítico e econômico por meio da tecnologia. Trata-se de uma forma contemporânea de dominação, em que países centrais — especialmente Estados Unidos e China — concentram o poder sobre os sistemas e infraestruturas que sustentam a economia global e a vida cotidiana digitalizada.
Essa dominação ocorre através de:
- Repatriação das partes mais inovadoras das cadeias de produção, como semicondutores, baterias, plataformas digitais e IA;
- Controle das cadeias globais de suprimentos de matérias-primas críticas (como o faz a China com terras raras);
- Liderança em tecnologias estratégicas, como design de chips (Synopsys e Cadence nos EUA), IA e nuvem.
Consequências para países periféricos
O Brasil, como muitos países em desenvolvimento, não controla sua própria infraestrutura digital e depende fortemente de empresas e plataformas estrangeiras:
- Hospedagem do SUS na AWS (Amazon Web Services): Um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo opera sob uma estrutura estrangeira, armazenando dados sensíveis da população brasileira em servidores fora do alcance da regulação nacional.
- Escolas, universidades e centros de pesquisa utilizam serviços, plataformas e repositórios tecnológicos externos, comprometendo a privacidade, integridade da informação e autonomia científica.
- Big Techs exploram dados brasileiros via práticas muitas vezes duvidosas — como scraping, uso não consentido de dados e modelagem preditiva — amparadas por lacunas legais e acordos assimétricos.
O papel da Soberania Digital
Diante desse cenário, a soberania digital é condição indispensável para a emancipação tecnológica, econômica e política. Um país digitalmente soberano é aquele que:
- Controla sua infraestrutura digital crítica (dados, nuvem, plataformas);
- Regula e aplica suas próprias leis de proteção de dados com enforcement real;
- Investe em produção local de conhecimento e tecnologia, com protagonismo de universidades, centros de pesquisa e setor público;
- Reduz a dependência estrutural de Big Techs e serviços externos, optando por software livre, repositórios nacionais e cloud soberana;
- Garante a integridade da informação e segurança cibernética, especialmente em setores estratégicos (educação, saúde, defesa, energia).
🌍 Exemplos internacionais
Alguns países já demonstram avanços concretos em soberania digital:
- China: Lidera a produção de veículos elétricos e semicondutores, possui suas próprias Big Techs e controla todo o tráfego digital interno.
- Estônia: Criou uma infraestrutura digital nacional segura e descentralizada, garantindo acesso universal e controle local dos dados.
- União Europeia: Investe em regulação rigorosa (como o GDPR) e iniciativas como o GAIA-X, um projeto de cloud europeia voltado à autonomia tecnológica do bloco.
🛡️ Cenário geopolítico: o Brasil no "campo de batalha digital"
Em um mundo cada vez mais tensionado, com conflitos híbridos e guerra tecnológica silenciosa, a terceira guerra já é uma realidade, ainda que fragmentada. O Brasil, mesmo sem ser diretamente atacado, será inevitavelmente atingido — se não tiver soberania digital, será um retalho de interesses externos.
Portanto, a urgência está em construir:
- Infraestruturas autônomas,
- Capacidade de resposta cibernética nacional,
- Tecnologias locais e inclusivas,
- Conscientização política e investimento estatal.
